sábado, 3 de dezembro de 2016

POR SEIS VEZES, EU CHOREI!

COLUNA DO MARCELO ABREU

Você vai chorar. Eu chorei lendo esse texto desse jornalista Pedreirense que há trinta e um anos mora em Brasília. Em Brasília não só tem bandidos disfarçados de políticos. Tem gente humana que chora diante das tragédias da vida. Você vai se emocionar com esse depoimento de um dos maiores jornalistas do Brasil. 


Nesses tantos anos de redação, em seis diferentes momentos, as lágrimas borraram todo o meu bloquinho de anotação. Minha letra, pavorosa, ficou ainda mais pavorosa e irreconhecível. Chorei com o menino queimado na Fercal, onde há uma fábrica de cimento. Ele morava num barraco e não poderia mais jogar futebol, paixão da sua vida. Apenas o seu rosto foi poupado.
 
Chorei com o menino que lutava contra um câncer raro e morava com o pai, que o criava sem a mãe, no estacionamento de um prédio abandonado, no começo da Asa Sul. O pai vigiava carros na redondeza. O amor do pai por esse filho era emocionante.

Chorei no enterro do João Cláudio Leal, o rapaz de 20 anos morto na saída de uma boate. Nunca esqueci a cena de ver aquela mãe, deitada no sofá da sala, na Asa Sul, na maior dor de sua vida. A família, ainda assim, me recebeu com exclusividade. Foi difícil apurar. Foi difícil ir ao velório. Ver o adeus dos amigos, tão jovens quanto o João. Foi difícil escrever o perfil dele, capa do Correio: "E ele só tinha 20 anos". 

Chorei ao ver a mãe e o pai de Maria Cláudia Del'Isola, destruídos no cemitério, ainda tendo que amparar uma outra filha que havia acabado de sair do hospital. Era um turbilhão de dor. Maria Cláudia foi assassinada pelo caseiro e pela empregada, numa perversidade sem tamanho, e ainda enterrada no jardim de inverno da casa, no Lago Sul. O crime chocou o país. Repercussão nacional.

Dias depois, eles me receberam para uma matéria exclusiva, de duas páginas. O jornal de domingo esgotou-se nas bancas em questão de horas.
Chorei diante de um dos meninos mais inteligentes e comoventes que conheci na vida. Francisco tinha 10 anos, uma grave doença degenerativa, era o melhor aluno da escola, mas sabia que ia morrer. Durante a matéria, ele me disse, na sala do pequeno apartamento, no Guará: "Tio, eu sei que tá chegando o fim, mas eu só queria viver mais um pouquinho pra ajudar minha mãe". A mãe era separada e o criava sozinha. Quando olhei para o fotógrafo, Daniel Ferreira, perto da janela, havia muita lágrima nos olhos dele também. Choramos juntos naquela sala. Até o menino. Foi uma das tardes mais tristes da minha vida. Eu queria salvá-lo.

Chorei também com os irmãos Ítalo e Kelvin, de Santo Antônio do Descoberto (GO), acometidos pela doença que ficou conhecida como "Os meninos do Óleo de Lorenzo". 


Vejo, agora, nessa tragédia de Chapecó, que chocou o país e o mundo, jornalistas, principalmente de TV, chorando ao vivo. Sim, repórteres choram. Choram muito. Sobretudo aqueles que se dedicam a contar histórias de vidas alheias. Não há neutralidade que resista. Rasgue o manual. E não haverá nenhum crime. Eu rasguei há tempos. Profissionalmente, foi a melhor decisão.

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