CAFÉ, BOLO DE MILHO E SAUDADE
Carlos Martins (02/07/2023)
Acordar cedo é um hábito cultivo. Acho importante — e até gosto — de alguns momentos de solidão. Sim, solidão. Não aquela imposta pelas intempéries da vida, mas a que voluntariamente assumimos como um momento importante para o nosso crescimento como ser humano. E assim ocorreu nesse último domingo.
No sábado, encontrei-me com minha filha que mora em Curitiba. Ela estava vindo de uma cidadezinha da Bahia chamada Tanque Novo. Passou aqui por Brasília para entregar o carro que alugara e pegar o avião para a capital paranaense. Mas o voo seria somente à noite. E tivemos uma tarde inteira de matação de saudade. Saudades acumuladas pela distância que maltrata todo santo dia o coração desse velho pai que é louco de razões perdidas pelas suas crias, mas também das saudades vindouras porque, brevemente, a distância terá o tamanho de um oceano inteiro a separar-nos. A pequena está de partida para terras lusitanas. Já falei para, ao chegar, não esquecer de entregar minhas lembranças ao Alberto Caieiro, ou Álvaro de Campos, ou Bernardo Soares, ou qualquer outro nome pelo qual ela tenha conhecido o grandioso Fernando Pessoa.
Mas voltando à passagem dela aqui pela terras candangas, fizemos um café para recepcioná-los. Sim, ela veio com a família de sua consorte. Essa parte da sua família eu chamo de concorrência. Mas nunca a concorrência foi tão bem-vinda. Uma galera cheia de vida, com uma conversa animada. E o café virou almoço, com um churrasco feito de improviso e, quando menos esperávamos, a mesa estava cheia de sentimentos de pessoas que se juntam para, simplesmente, deixarem se ligar pelos laços sutis de corações amorosos.
Ao final da tarde, já à noitinha, após muitos abraços e beijos de despedida, deixei-os ir; não sem antes deixar bem guardadinhos aqui na minha memória todos os momentos dessa tarde que já ficou cheia de saudades. Foram... viajaram. Antes de dormir, recebi a mensagem: “chegamos a casa, pessoal”. Meu coração de pai aconchegou-se em meu peito, virei-me para o lado, puxei as cobertas e dormi.
Acordo, já domingo, muito cedo. Todos dormindo. A casa será minha por um bom tempo. E me entrego à solidão para revirar meu baú de memórias e organizá-las, pois tinha novos moradores que precisava acomodar. Acomodação feita, fechei-o. Respirei fundo: ainda não sei quando vou remexer aqui novamente, mas sei que não demorará muito porque a minha saudade é maior que o Atlântico.
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