domingo, 27 de junho de 2021

PEDREIRENSES PELO MUNDO: Coluna do Allan Roberth

 OURO

O sonho de tornar-se rico à custa do trabalho, herdando, ou contando com a sorte de uma hora para a outra sempre permeou a mente humana e é perseguido por muitos que se dedicam exaustivamente ao labor, se ariscam em jogos ou se aventuram em verdadeiras sagas em busca de transformar o tal sonho em realidade.

O século XVII do Brasil colônia, é marcado pela interiorização que implicava pelo adentramento aos sertões, visto que até então somente o litoral fora explorado pelos colonizadores europeus com o plantio da cana-de-açúcar no nordeste brasileiro.  A partir de Minas, seguindo por Goiás e Mato Grosso inicia-se a exaustiva busca de pedras preciosas. 

Os mineiros; geralmente escravos, se arriscavam nas escavações das rochas em busca do ouro e outros metais valiosos que rendiam altos impostos à coroa portuguesa e muita riqueza aos donos das terras. À propósito a expressão “quintos dos infernos” surge nesse contexto como forma de condenar o imposto de um quinto do ouro retirado, pago à realeza pelos exploradores de mesmo. 

Já no século XX, mais precisamente no final dos anos setenta surgiu a notícia de que o agricultor Genésio Ferreira da Silva havia encontrado uma pepita com 13 quilos de ouro na Serra dos Carajás, estado do Pará, área que pertencia à Companhia Vale do Rio Doce. Em pouco tempo a busca pelo metal atraiu milhares de homens, especialmente nordestinos que afugentados pela seca, desemprego e pobreza se aventuraram no que ficou conhecido como “formigueiro humano”. 

Estima-se que já no início dos anos 80 havia ali cerca de 5.000 homens na atividade arriscada de encontrar o ouro. Expressões como “bamburrar”, “barranco”, “cavador”, “enchedor”, “formiga” passaram a ser conhecidas pelo resto do Brasil pois elas determinavam o linguajar próprio da atividade extrativista de Serra Pelada.

Para aquela região do sudeste do Pará migrou gente de todas as partes do país. Conta-se coisas terríveis acontecidas ali nos anos em que durou a exploração do garimpo. O alto custo de vida, a violência, a “falta” de mulheres, a precariedade das moradias, das condições sanitárias e de tantos outros problemas surgidos com a super população eram apenas alguns dos problemas reais enfrentados pelos aventureiros.

As famílias da região do médio Mearim também foram impactadas pela atividade extrativista dos garimpos pois uma leva de homens, em sua maioria pais de família rumaram para lá em busca do sonho de enriquecer. Serra Pelada era o destino da maioria deles. Porém, o que infelizmente acontecia era que a busca pela sobrevivência em um ambiente de guerra os obrigavam a reagir de várias formas. 

Quantas mulheres guerreiras ficaram na luta de criar sozinhas os filhos de cujos parceiros sumiram no formigueiro de gente que trabalhava dia e noite, mas o que conseguia, dava apenas para o sustento próprio e a sua manutenção naquele insalubre lugar?

Quantas delas ficaram “sendeiras” como dizemos por lá ao saberem que seus maridos haviam arrumado outras por lá, ou mesmo viúvas de um sonho que nunca se realizou e se transformou em pesadelo?

Quantos filhos cresceram sem a presença do pai, que em sua maioria até tinham planos de voltarem com dinheiro para dar uma vida melhor para sua família, mas o que aconteceu foi que o vil metal os transformou em órfãos de carinho, amor e até mesmo da ausência permanente em suas vidas?

Por outro lado, algumas mulheres atraídas pelas notícias de que a prostituição rendia muito dinheiro por aquelas bandas também se aventuraram na ariscada empreitada da chamada “vida fácil” que não justifica o termo e por lá perderam suas vidas para a violência de uma terra sem lei, sem escrúpulos.

Muito raramente se via alguém retornar de Serra Pelada e os poucos casos que deram certo eram logo reconhecidos pelas figuras de homens com seus grossos cordões de ouro no pescoço, seus anéis de chapa no dedo e alguns até com o metal estampado nos dentes o que causava logo um impacto e muitas vezes até preconceito.

O estilo musical também os definia e se fizeram conhecer em nosso meio figuras como Milionário e José Rico, Amado Batista, Carlos Nascimento e outros. 

Passados alguns anos do encerramento definitivo do garimpo de Serra Pelada, o que constatamos foi que alguns poucos dos aventureiros puderam realmente mudar de vida e ao voltarem reconstruíram suas famílias e seus planos. A maioria, infelizmente, amargou a desestrutura total das vidas, famílias e sonhos que se derreteram igual ao ouro; porém, não pagaram o preço real da arriscada aventura.



























Um comentário:

  1. Belíssima reflexão sobre o sonho dourado de Serra Pelada e suas consequências sociais. Parabéns, Allan Roberth.

    ResponderExcluir