Coluna do Professor Ricardo Costa Gonçalves
A Organização Mundial de Saúde (OMS), em 11 de março, declarou a pandemia de CONVID – 19, doença causada pelo coronavírus e que pode ser assintomática, causar síndromes respiratórias graves, causando óbito. Inicialmente, ocorreu na cidade de Wuhan, capital da província de Hubei na China, mas já se alastrou pelos cinco Continentes em ritmo exponencial. Temos uma crise epidemiológica, mas também uma incomparável crise econômica que pode ser mais ou menos grave e duradoura em função das medidas emergenciais de políticas econômicas tomadas.
A crise econômica ocasionada pela pandemia do coronavírus é de natureza distinta das crises que tem ocorrido costumeiramente no capitalismo. A particularidade da crise atual é que ela tem início no mundo real, no âmbito produtivo, para depois impactar os mercados financeiros e de crédito. É diferente da crise de 2008, que teve início no mercado de crédito imobiliário americano e logo se espalhou para a totalidade do setor financeiro para enfim atingir a economia real. Em 2008, o esforço dos Bancos Centrais visando “salvar” as grandes instituições financeiras e normalizar o mercado de crédito foi capaz de reverter a crise e evitar a queda mais acentuada da produção, na atual crise as autoridades monetárias é capaz de apenas adiar o colapso do mercado de crédito, sem ter nenhuma capacidade normalizar a atividade produtiva. Segundo Melo et al (2020) , a cada novo anúncio de medidas de expansão da liquidez e compra de ativos pelas autoridades monetárias, os mercados aprofundam sus perdas patrimoniais, com os investidores fugindo em desespero dos títulos privados, sem nenhuma perspectiva de valorização e/ou geração de dividendos, e correm para títulos públicos.
No campo geopolítico, a globalização mostrará sua perversidade: a interdependência imposta pela cadeia global de valor, em prol de uma maior especialização e eficiência, esconde uma imensa vulnerabilidade para as empresas e nações. As Redes de fornecimento estão se rompendo pelo impacto da pandemia em todos os continentes, viagens internacionais estão sendo restritas com o fechamento de fronteiras e medidas protecionistas estão sendo tomadas. A disputa do petróleo protagonizada por Arábia Saudita e Rússia também é exemplo dessa interdependência, que atingi diretamente as cadeias produtivas e as empresas do setor de energia, sendo particularmente negativas para nações dependentes da renda do Petróleo.
Como se trata de uma crise com início na paralisação da esfera produtiva, a superação só ocorrerá quando a situação sanitária for controlada ou houver algum tratamento/vacina eficaz para o vírus, possibilitando a produção em condições normais. “Enquanto isso, o gigantesco esforço dos bancos centrais para manter os mercados financeiros e de crédito funcionando se esvai, já que a perspectiva de geração de receitas e lucros das empresas é cadente. Os mercados tornam-se totalmente disfuncionais e apresentam grande volatilidade, mostrando-se incapazes de precificar os ativos devido à enorme incerteza que impede qualquer análise minimamente segura sobre o futuro” (Melo et al, 2020).
A circunstância epidemiológica da crise faz com que ocorra uma ruptura geral na forma de sociabilidade interpessoal e via mercados. As medidas, necessárias, de distanciamento social agravam a queda na demanda em diversos setores que também serão atingidos no lado da oferta da queda da produtividade e à provável falência de empresas. Assim, a superação da crise econômica não depende apenas da recuperação das condições de funcionamento normal do mercado financeiro, mas da manutenção da renda das empresas e das famílias em um momento de paralisação dos fluxos.
Vários governos já enxergaram que, diante deste cenário, a única saída é a utilização massiva da política fiscal. Até economistas que são identificados com políticas de austeridade e redução do endividamento público, já se pronunciaram a favor de uma forte expansão fiscal, sem maiores preocupações com os níveis de déficit e dívida pública neste momento.
Resumindo, a particularidade da atual crise econômica exigirá uma resposta bastante diversas da utilizada ao longo da crise de 2008. A política monetária no máximo será capaz de adiar a crise de crédito, mas será a política fiscal que terá a capacidade de salvar a economia “real” e promover a retomada, uma vez que a crise sanitária seja superada.
Quando a emergência sanitária for superada, será necessário reconstruir instrumentos públicos de coordenação do investimento, uma vez que o setor privado tende a sair muito débil do ponto de vista financeiro, mais endividado e com menores receitas. Será necessário reconstruir os mecanismos de financiamento do Estado, promovendo reforma tributárias centradas em altas rendas e grandes patrimônios. E por fim, “essas duas mudanças ligadas abrirão caminho para repensar o modelo de capitalismo que prevaleceu após a crise de 2008, ainda que abalado em suas estruturas e crescentemente incapaz de promover o crescimento econômico e a inclusão social” (Melo et al, 2020).
* Professor, graduado em Matemática pela Universidade Estadual do Maranhão (UEMA); Mestre em Governo, Estado e Políticas Públicas pela Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais (FLACSO).
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