terça-feira, 28 de maio de 2024

ESPAÇO ACADÊMICO: Coluna do Padre José Geraldo Teófilo da Silva

 MEU MUNDO FECHADO

Padre José Geraldo Teófilo da Silva, Reitor do Santuário São Benedito/Foto de Sandro Vagner.

Foto ilustrativa, enviada por Padre José Geraldo, via Whats'App, em 28.05.2024, às 10h32. 

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Se o mundo vive desatencioso e causa espanto, não podemos ser igual ao mundo. Martin Buber, em sua obra "Eu e Tu", destaca a importância do encontro genuíno entre as pessoas. Para ele, a verdadeira existência humana só ocorre na relação dialógica, onde o "eu" encontra o "tu" de maneira plena e autêntica.

Nesse encontro, ultrapassamos a superficialidade e alcançamos uma profundidade que só a interação humana pode proporcionar

Diante dessa realidade, nós vivemos em um mundo que se tranca. Casas são trancadas, portas e janelas, armários, cofres, bureaux e gavetas que talvez guardem preciosidades ou não, como fala o filósofo Gabriel Chalita.  

Pessoas não foram feitas para se trancarem; pessoas nasceram para outras pessoas. Podemos citar a psicanalista Melanie Klein, que falou sobre a importância das relações interpessoais no desenvolvimento psicológico. Ela argumentava que desde cedo, as interações com figuras maternas e paternas moldam nossa psique e nossa capacidade de nos relacionarmos de maneira saudável com o mundo.

Não se abraça a si mesmo no trancado da solidão. A solitude só vale a pena se ao destrancar o eu e se envolver com outras pessoas. Não é natural falar consigo mesmo, falar sozinho, no trancado medo do encontro. 

Faz medo que o medo domine. Jean-Paul Sartre, por outro lado, explorou a ideia de que "o inferno são os outros", referindo-se às dificuldades e angústias que surgem das relações humanas. No entanto, mesmo ele reconheceu que a identidade e o autoconhecimento se desenvolvem em interação com o outro. Sem o outro, nossa existência se torna um vazio solitário, como um eco sem resposta.

O egoísmo não pode impedir a arte da amizade. Não podemos viver sem correr riscos ou se arriscar. O outro é um eterno aprendizado. O "tu" me desinstala. 

Viktor Frankl, sobrevivente do Holocausto e fundador da Logoterapia, afirmou que o sentido da vida frequentemente se encontra em nossos relacionamentos e contribuições para a vida dos outros. Em seu livro "Em Busca de Sentido", ele narra como a conexão com outros prisioneiros e o amor por sua esposa lhe deram força para sobreviver aos horrores dos campos de concentração.

Não podemos fazer como a andorinha voar sozinha, uma andorinha só não faz verão. Portanto, ao nos fecharmos para o mundo, estamos indo contra a nossa própria natureza e contra o que pensadores ao longo dos séculos têm argumentado sobre a importância da interação humana. 

O isolamento pode nos proteger momentaneamente dos riscos, mas também nos priva das alegrias e do crescimento que só o contato com o outro pode proporcionar.

Afinal, é através do outro que nos conhecemos e encontramos nosso lugar no mundo. Não podemos viver em uma eterna prisão de nós mesmos, pois, como diria Antoine de Saint-Exupéry, "o essencial é invisível aos olhos" e só se revela no encontro genuíno e na abertura para o próximo.

Acredito que, quando nos trancamos, viramos reservatório de problemas e inquietudes. A não ser que sejamos sociopatas, que não se importam com ninguém, ou narcisistas. Faz medo um dia cantar a melodia de Maysa quando ela diz: "meu mundo caiu". Não estou falando de quem mora sozinho, estou falando de quem cria seu mundo sem precisar de ninguém.

Aristóteles, por exemplo, afirmou que "o homem é um animal social por natureza". Ele via a vida em comunidade como essencial para o desenvolvimento humano, destacando que a amizade e a interação são fundamentais para a realização pessoal.

Este comportamento de se isolar e se fechar para o mundo pode ser analisado à luz de diversos pensadores. Sigmund Freud, por exemplo, postulou que a nossa saúde mental está intrinsecamente ligada à nossa capacidade de formar vínculos com os outros. Ele argumentava que a incapacidade de formar esses vínculos poderia levar a neuroses e outros distúrbios psicológicos. 

Tomo emprestadas as palavras do psicólogo humanista Carl Rogers que enfatizava a importância do ambiente para o crescimento pessoal. Ele acreditava que um ambiente positivo, caracterizado por autenticidade, aceitação e empatia, é crucial para que as pessoas possam se desenvolver plenamente. Isso só pode ser alcançado através de relações significativas e genuínas com os outros. Pegue a chave da alteridade e se abra para o outro!


















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