Coluna do Doutor "Doidão"
(Ano I, Edição V, Ano 2018)
(Ano I, Edição V, Ano 2018)
Já que começamos a falar da
função do vereador há alguns dias atrás, acho que vale a pena discorrer mais
sobre esse assunto.
Analisando
os fatos políticos de nossa região, nos deparamos com uma realidade política
temerária: a subserviência dos poderes legislativos municipais aos chefes de
executivo de plantão no momento.
Quando
a Constituição Federal impõe o papel dos legislativos, dá ao vereador a função
de fiscalizar os atos do Executivo e legislar (fazer leis, normas e regras que
organizam a sociedade, estabelecem garantias e direitos e impõem obrigações,
com as devidas previsões de punições para os desrespeitos que acaso possam
ocorrer ao estabelecido). A mesma Constituição recomenda harmonia entre os
poderes.
Esse papel legiferante
normalmente é limitado pelo próprio desconhecimento do vereador da função que
tem; e como ex-vereador que sou, reconheço também que pela escassez de
recursos, falta assessoria técnica nas Câmaras Municipais para prover os
vereadores dos conhecimentos necessários para legislar. Mas, a falta de vontade
e compromisso com as obrigações da função falam mais alto, pois há como driblar
essas limitações - por experiência própria posso afirmar isso. Já o papel
fiscalizador, esse sim é que é o problema, já que na atual realidade tudo conspira
e se une para que essa função exponencial seja omitida e assim se configura o
pior dos crimes de responsabilidade da edilidade.
O vereador é o para-choque da
classe política. Os prefeitos, os deputados, os senadores e os governadores são
quase inacessíveis à abordagem popular por razões inerentes às funções que
exercem, mas o vereador não pode nem tem como se esconder do povo e é abordado
e cobrado a todo momento para fazer de tudo, desde pagar a dose de cachaça no boteco
da esquina até construir a ponte que falta no bairro ou povoado. E muito do que
se cobra dele não é de sua obrigação, mas do prefeito.
E
o vereador consome o seu mandato em realizar favores e mais favores que exigem
muito dinheiro e, condicionando esses favores ao voto, imagina assim se
viabilizar para a reeleição. E como o executivo tem mais recursos, precisa da
ajuda do prefeito para custear esses favores, empregar seus apaniguados e
receber e oferecer outras benesses mais.
Portanto,
precisa ser aliado do prefeito e termina se cegando ao que deveria ver e
apontar como erro e se omite completamente de seu papel fiscalizador. Juntando
tudo isso com a má fé de alguns chefes de executivo, está formada a
circunstância perfeita de conivência e omissão para acontecer toda espécie
possível de crime na gestão pública, com a população saindo sempre como a maior
prejudicada.
Assim, a harmonia entre os
poderes recomendada pela Constituição Federal transforma-se em submissão.
Legislativos de cócoras perante os executivos, câmaras de joelhos perante as
prefeituras e vereadores curvados diante dos prefeitos a mendigar migalhas.
De
grande e principal espaço para o debate, discussão e solução dos problemas da
sociedade, as Câmaras Municipais hoje não passam, em sua maioria, de meros
órgãos cartoriais homologadores da vontade dos chefes dos executivos
municipais. Lamentável.
Mesmo sendo o para-choque da
classe política, o vereador é dessa classe a categoria mais desvalorizada. Só
tem mesmo valor e é lembrado pelos detentores de cargos eletivos mais elevados
quando é para eleger os deputados. Aí, sim, o vereador vale ouro, pois se
transforma em verdadeiro cabo eleitoral de luxo. De tanto precisar do prefeito,
torna-se enfadonho e chato ao alcaide e aos seus auxiliares diretos e com isso
perde valor e respeito, pois a dependência vai se avolumando e ele fica refém
das migalhas do executivo.
Soma-se
a isso uma dificuldade enorme de união e organização da categoria para as
defesas de seus interesses políticos de elevada estatura e valorização de seu
papel. E tudo isso resulta e justifica a atual situação e desmoralização da
função e da figura do vereador, que é um elemento importantíssimo e exponencial
da classe política.
A situação é tão grave que uma
pesquisa realizada pela União de Vereadores do Brasil - UVB em 2013 em várias
cidades brasileiras de médio e pequeno porte, perguntou à população que
repartição preferia que fosse fechada, se a Câmara Municipal ou a quitanda da
esquina e mais de 70% da população pesquisada preferiu que fosse fechada a
Câmara de Vereadores.
Mas de quem é a culpa? Será que
só o vereador é culpado dessa situação? Imagino que não somente ele. A
população é a principal responsável, pois a composição da Câmara Municipal é a
expressão exata da sociedade que representa; e analisando dessa forma se
conclui que se existem maus vereadores, é porque existem maus eleitores.
O
povo é que tem que escolher com mais cuidado os seus representantes, já que nas
Assembleias Legislativas e no Congresso Nacional não é tão diferente. Tem que
acabar com essa história do povo eleger candidato que quer somente ter um bom
salário sem dar expediente e garantir um status que lhe possibilite barganhar
vantagens em troca da omissão de sua função principal.
Portanto, nossa gente tem que
escolher melhor entre os três tipos de vereadores existentes, que são o vereador, o variador e o viriador. O
primeiro é aquele que legisla e fiscaliza com responsabilidade e independência;
o segundo é aquele que varia politicamente de um lado para o outro conforme a
sua conveniência pessoal e política do momento; e o terceiro tipo é aquele que
não desgruda da virilha do prefeito.
Allan Roberto Costa Silva
Médico, ex-presidente da Câmara Municipal de Pedreiras, membro da Academia
Pedreirense de Letras e da Associação de Poetas e Escritores de Pedreiras-MA.
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