UM GOIABAL DE SAUDADES
Carlos Martins (30/07/2023)
Aqui em casa, não é novidade para ninguém que gosto de acordar cedo todo dia. Acho que o dia rende mais e que, também, aproveitamos muito melhor o tempo a que dispomos. Nos finais de semana, quando a família tem oportunidade de interagir mais de perto, quando a galera acorda, o café da manhã já está pronto e à disposição na mesa. A refeição servida na mesa é um hábito que procuro manter vivo como forma de reunir a família nas poucas ocasiões de que dispomos dentro do nosso cotidiano moderno.
E esse domingo não foi diferente. Acordei cedo, preparei o café, botei a mesa, etc., etc., etc. Tudo pronto, sentei-me com minha indefectível caneca branca, que importei diretamente da Ilha do Amor, com os dizeres “dia de vaca não conhecer bezerro” — porque os dias devem ser intensos em tudo que nos dispomos a fazer — e fiz calmamente o meu desjejum dominical. Quando já estava lavando a louça que tinha sujado, veio-me à memória um comentário que li sobre uma postagem em minhas redes sociais. Um amigo das antigas, e que não nos vemos há mais tempo que gostaríamos, comentou que se lembrava de mim de uma época em que eu morava na casa que hoje é do Dr. Edivaldo Elói, advogado, cordelista e poeta dos bons lá minha saudosa Pedreiras, um pedacinho de chão abençoado por São Benedito, lá no meio do Maranhão.
Isso foi o suficiente para começar a derramar diante de mim uma verdadeira cascata de lembranças que estavam muito bem guardadas dentro da minha saudade.
Abri o portão de madeira crua que se encontrava no início de um caminho sinuoso que levava do terraço de frente da casa até a calçada. Antes de sair, senti no corpo a leve brisa que soprava e balançava a copa de duas grandes mangueiras que adornavam a entrada, eram lindas, com copas muito frondosas e que nos presenteava com deliciosas mangas de mesa e mangas de massa.
Saí. Caminhei para o meio da rua calçada com pedras para torná-la um pouco menos lamacenta nos períodos de chuva. Parei, respirei fundo. Bem de frente, com as portas ainda fechadas, vi a casa do “seu” Zé Tavares, que na boquinha da noite vinha sentar-se no terraço lá de casa para uma conversa animada com meu pai. Um pouco mais a frente, a casa do pastor Metom, grande homem e religioso de prestígio da cidade, pai de dois amigos de infância. Comecei a caminhar um pouco, para não perder nenhum detalhe. Passei em frente à casa do “seu” Adauto, que trabalhou na Cemar. E continuei caminhando até chegar à barreira, lugar já próximo ao Sítio São Miguel, onde a meninada se juntava no final das tardes para jogar bola.
Esse lugar, o bairro Goiabal, tem morada constante em mim. Não esqueço um só instante. Depois que minha família saiu de Pedreiras, sempre que volto, passo por lá, bem devagar para que o acaso me presenteie com um encontro com amigos do passado, fato que ocorreu pouquíssimas vezes, talvez porque a galera também tenha ido embora de Pedreiras. Fato é que não vou a Pedreiras sem visitar o meu Goiabal.
O tempo passou, mais de trinta anos, e o Edivaldo me convidou para encontrá-lo em sua casa. Fiquei exultante. Não cabia em mim de tanta alegria. Chegou a hora. Parei o carro. Desci. Toquei a campainha. Edivaldo atendeu e, após minha identificação, informou que iria abrir o portão. Fiquei cara a cara com o portão quando, de repente, um barulho. Ele estava abrindo. E pela primeira vez, deparei-me com todo o meu baú de memórias de infância e adolescência. Consegui ver tudo.
Fui recebido por Edivaldo e sua esposa de forma muito carinhosa. Convidaram-me para entrar na sala, depois ficamos sentados no terraço tomando uma cerveja e conversando. Foi tão maravilhoso ter voltado ali que, receoso de ser invasivo, fiquei quietinho sentado na cadeira e, de vez em quando, soltava um olhar furtivo pelo quintal, pela casa... e viajava no tempo.
Hoje, ao lado de minha gratidão pelo casal por ter me proporcionado tamanha felicidade, resta-me a grande falta que sinto do convívio com os amigos que deixei em Pedreiras.
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