sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Pedreirenses Pelo Mundo: Coluna do Carlos Augusto Martins Netto

 BRAÇOS A POSTOS!

Por Carlos Augusto Martins Netto - Servidor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Farmacêutico, Escritor e Poeta.

Doença causada por vírus e com sintomas, inicialmente, muito semelhantes aos de uma gripe – febre, mal-estar, dor de cabeça e dores musculares. Propaga-se com grande facilidade por meio de gotículas respiratórias suspensas no ar, saliva e toque em superfícies contaminadas. Ainda não tem tratamento e a prevenção é a única maneira de proteção. E quando se fala de proteção, trata-se de atitudes e posturas que as pessoas devem tomar para impedir a propagação do vírus causador da doença. No caso específico, uso de máscaras, evitar tocar em superfícies e objetos que, porventura, possam estar contaminados e... evitar o convívio com pessoas contaminadas.

Estou me referindo à varíola, uma doença que não tem cura e a única forma de luta contra ela é a vacinação. Pois bem, no final do século XIX já existia vacina contra a varíola, contudo, as pessoas, principalmente as camadas mais populares, rejeitavam-na. Naquela época, no Brasil, a vacinação de crianças e adultos era obrigatória, motivando o povo a rebelar-se contra tal medida sanitária.

Com isso, em 1904, eclode no Rio de Janeiro a Revolta da Vacina. Havia muitos motivos para que as pessoas recusassem tomar a vacina e um deles – motivo de risos, se não fosse trágico – era porque a produção da vacina consistia na utilização do líquido das pústulas de vacas doentes. Isso, por si só, já afastava a predisposição do povo em aderir à vacinação. E para completar, corria o boato de que quem se vacinasse adquiriria feições bovinas. 

Como se vê, fake news não é uma exclusividade do século 21. Muito menos a utilização de argumentos absurdos com o intuito de impedir que a população se vacine em massa, sem receios desmedidos. 

Nesse momento, gostaria de dar um salto no tempo. Sair do final do século 19, início do 20 e pular para o 21. O mundo enfrenta uma séria pandemia — a Covid-19 — causada por um vírus que não tem medicamento específico para seu tratamento. Seus sintomas assemelham-se aos de uma gripe — febre, mal-estar, dor de cabeça e dores musculares — e, no momento, a única maneira de proteção é a prevenção. Ou seja, uso de máscaras, evitar tocar em superfícies e objetos que, porventura, possam estar contaminados e... evitar o convívio com pessoas contaminadas. Sim, copiei literalmente de propósito para deixar claro o paralelo que existe entre as duas doenças.

No caso da varíola, a Revolta da Vacina, ocorrida no Rio de Janeiro, além da questão de violação de direitos individuais, pois a polícia sanitária poderia invadir as casas das pessoas e promoverem a vacinação à força, houve, também, o uso político. Utilizaram-na como pretexto para tentar depor o presidente de então.

No paralelo com a Covid-19, vê-se muita discussão em torno da vacina. O que mais chama a atenção é o visceral engajamento da poderosa indústria farmacêutica no desenvolvimento de uma vacina que dê conta de barrar a pandemia. Interesses econômicos à parte, é interessante observar o poderio intelectual e científico que elas detêm. Um outro fator também relevante está sendo a capacidade de resposta dos órgãos sanitários envolvidos tanto no desenvolvimento quanto no registro da vacina. Prazos foram modificados e fluxos de trabalho redesenhados visando o bem maior: ofertar uma vacina segura e eficaz no menor prazo possível para a sociedade.

Um outro fato salta aos olhos: a incrível transparência que está sendo dada tanto pela indústria farmacêutica quanto pelos órgãos sanitários, no que se refere ao desenvolvimento da vacina. Hoje, a sociedade toma conhecimento, quase que instantaneamente, de todos os passos que são dados nos ensaios clínicos que estão sendo realizados para comprovar a eficácia e segurança da vacina. A meu ver, tanta informação, é inédita.

Contudo, tal qual a varíola, a Covid-19 também está sendo usada para auferir dividendos políticos. A casta política inescrupulosa está se valendo da incapacidade crítica da população — haja vista que o assunto é muito técnico e, portanto, não é de domínio da esmagadora maioria da população — para manipular a opinião pública e tentar incutir um viés ideológico a um assunto iminentemente sanitário.

A meu ver, não importa de onde venha a vacina, se ela passar pelos critérios exigidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), nosso órgão sanitário responsável pela avaliação dos dados de segurança e eficácia de todos os medicamentos e vacinas para, posteriormente, liberá-los para comercialização e, consequente, uso pela população, está tudo bem. É assim que acontece com todos os medicamentos que são consumidos pela população brasileira, e não tem esse alarde todo. Porque são medicamentos para tratar patologias que não rendem dividendos políticos!

Uma pergunta: por que os medicamentos que são desenvolvidos para o tratamento dos diversos tipos de cânceres não têm toda essa confusão? Ou o câncer não mata? Não tira vidas de milhares de pessoas todos os anos? Ganhos políticos, guerra por poder, é tudo que nossa classe política almeja. E o povo? Ah, o povo fica no meio desse salseiro, tentando sobreviver com informações falsas, manipuladas por meio das fake news, as quais são produzidas por pessoas contratadas e correligionários dessa própria classe política. Pobre povo brasileiro!

Mas voltando à varíola, após a Revolta da Vacina, o povo não se imunizou contra a doença e em 1908, ocorre a mais violenta epidemia da doença na história do Rio de Janeiro e o povo corre para ser vacinado... dessa vez, sem a obrigatoriedade, pois o presidente revogou a lei que a tornava compulsória.

Uma outra pergunta: qual o motivo de toda essa celeuma sobre a obrigatoriedade da possível vacina contra a Covid-19? 

Vocês não acham que quem coloca essas discussões em pauta têm objetivos escondidos? Dirigentes do executivo abordarem o assunto sem serem perguntados não denota outros interesses que não os sanitários e a saúde da população? Pessoalmente, acredito que estejam se promovendo com fins políticos, para demarcação de território e luta por poder.

A minha esperança é que, tal qual ocorreu com a varíola, surja uma vacina eficaz e segura contra a Covid-19 e que ajude a controlar essa tão malfadada pandemia. No Brasil, particularmente, para que, além de tudo, derrube o palanque eleitoral dos inescrupulosos.

A vacina está chegando. Já está bem ali na esquina. Já podemos quase tocá-la.

— Vacinas, sejam muito bem-vindas! Nós te recepcionamos com os braços a postos.
























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